Na reportagem que abre a série de “Túneis e Estruturas Subterrâneas – o pensamento e a pesquisa das universidades brasileiras” – que busca trazer para a prática dos túneis a visão da academia, o ex-presidente da ITA (International Tunnelling and Underground Space Association) e do CBT, André Assis, fala sobre as linhas de pesquisa na Universidade de Brasília, onde é professor titular, e das inovações no mundo dos túneis.
André Assis tem uma carreira de quase 28 anos na UnB – Universidade de Brasília, sempre ligado à área de túneis. Para ele, o futuro dos túneis está, inevitavelmente, ligado à gestão de risco aplicada à engenharia de túneis. E esta é uma das linhas de estudos de grupos da UnB.
O conceito de gestão de risco aplicada à engenharia tem evoluído muito, a ponto de ser conhecido como A Nova Engenharia. Trata-se de tomar decisões baseadas não somente na técnica, nos cálculos da engenharia, mas tomar medidas cautelares em função do risco que aquela obra pode causar (em caso de ruptura, por exemplo) no ambiente em que está inserida. “Isso justifica medidas de engenharia mais elaboradas e robustas em determinadas obras para evitar que o entorno seja prejudicado em caso de problemas”, explica André Assis.
“Na UnB, estamos desenvolvendo uma técnica para a materialização e monetização desse conceito, para calcular tudo isso e aplicar em túneis”, conta o professor. “É um mapa que identifica os locais de maior ou menor risco, ao longo da obra, por meio de cores, para que, naqueles locais onde o risco é maior, a atenção seja redobrada”. No Brasil, a UnB lidera os estudos e desenvolvimentos nesse assunto.
Outro foco dos estudos na UnB são os túneis construídos em rochas sob altas tensões. São duas preocupações principais. A primeira é detectar se a rocha tem potencial de explosão (rockburst). “Essa resposta não é muito óbvia. Há uma série de critérios que foram desenvolvidos ao redor do mundo que indicam a probabilidade de a rocha explodir”, explica o ex-presidente do CBT. “Estamos testando esses critérios, analisando quais os mais assertivos e verificando se é possível modificar um pouco cada um para acertar ainda mais”.
A segunda preocupação é com a segurança da obra. Uma vez identificado que há o potencial de explosão da rocha, é preciso pensar no projeto e na sequência construtiva do túnel. “Esse túnel vai precisar de uma forma diferenciada de escavação para evitar a explosão das rochas”, ressalta Assis. “A sequência construtiva terá de ser diferente e o túnel precisará de um sistema de suporte que suporte a energia decorrente da explosão caso ela ocorra”.
Tendências Futuras
Além da gestão de risco aplicada à engenharia de túneis, há muita tecnologia sendo desenvolvida a nível internacional.
Uma das principais linhas de estudo diz respeito às tuneladoras. O objetivo é torná-las o mais flexível possível. Hoje, cada tuneladora é feita sob encomenda para determinada obra. Por conta disso, a utilização da tuneladora só se viabiliza em obras muito grandes, uma vez que o custo da máquina é arcado por uma só obra.
A indústria de túneis mundial está estudando formas de fazer com que essas máquinas se tornem mais flexíveis. “Se ela foi feita para uma obra de 1km, por exemplo, depois ela poderia ser desmontada e, após algumas adaptações, ser utilizada em outra obra. A tuneladora conta com alguns dispositivos que a fazem trabalhar bem em diferentes situações – ela corta rocha, mas também solo, um solo mais argiloso e outro mais arenoso etc.”, exemplifica Assis.
Ao mesmo tempo, a indústria química está também desenvolvendo diversos novos produtos para neutralizar os efeitos maléficos que alguns solos têm com a máquina. Ou para ajudar a ‘preparar’ o solo para que a máquina possa cortá-lo.
São inovações tanto na máquina quanto em produtos injetados no solo para adaptá-lo à tuneladora. A flexibilização da máquina e uma melhor preparação do solo são a equação perfeita para que mais túneis se tornem viáveis. “As tuneladoras são, sem dúvida, o que faltava para viabilizar túneis em alguns tipos de maciços”.
Os profissionais
No Brasil, como acontece na maioria dos países no mundo, há pouquíssimas universidades que têm a cadeira de engenharia de túneis nos cursos de engenharia civil. “Os profissionais precisam de uma formação mínima em engenharia de túneis. Eles precisam sair da graduação pelo menos tendo ouvido falar dessas soluções”, afirma o professor.
Mas, como essa ainda não é a realidade da engenharia, os cursos complementares são de fundamental importância na formação dos profissionais desta área. “Um curso que merece destaque é o mestrado em Engenharia de Túneis, ministrado em São Paulo”, lembra. “É um curso totalmente inovador, bastante completo e que já está em sua sétima edição, sempre com sucesso de público”.
“O treinamento dos profissionais é, ao meu ver, uma das funções do CBT. O Comitê deveria ter uma programação regular de cursos de túneis”, destaca André Assis. “O CBT tem, a nível nacional, a mesma missão que a ITA tem, a nível internacional, de preencher a lacuna deixada pelas universidades na formação dos profissionais de túneis. A ITACET foi criada justamente por percebermos essa necessidade do mercado e dos profissionais”. Assis foi o fundador da ITACET, Comitê da ITA para Educação e Treinamento.