Os modelos de contratação de obras subterrâneas foram o foco do encontro que aconteceu no dia 19 de fevereiro, no Instituto de Engenharia, em São Paulo. Com 70 participantes presentes e mais 30 online, o evento, organizado pelo CBT, abordou a importância de procedimentos contratuais específicos para este tipo de obra. A estrela da noite foi o Geotechnical Baseline Reports – GBR, ferramenta que recomenda a descrição concisa e direta das características e comportamento do maciço para a redação do contrato de maneira a reduzir ao máximo o risco de prejuízos tanto para o dono da obra quanto para o executor. “Trata-se de pagar o preço justo”, explica o engenheiro Randall Essex, um dos idealizadores do GBR e palestrante principal do evento. “Para isso, basta saber com a maior acurácia possível o que se quer e o que pode ser encontrado no caminho. E prever tudo isso em contrato”.
Jairo Pascoal Júnior (foto à esq.), engenheiro e presidente do Comitê Brasileiro de Túneis, foi o responsável pela abertura do encontro. Ele lembrou que, devido à relevância do tema, as questões contratuais já estão na pauta do CBT há algum tempo. Em 2018, foram realizados dois eventos sobre o assunto. O primeiro, realizado em março, foi a palestra sobre Critérios Legais para a Divisão de Riscos Geológicos e Geotécnicos em Grandes Contratos de Obras e Projetos. O segundo, em setembro, foi o I Seminário de Práticas Contratuais de Túneis, em Brasília. E agora, em fevereiro de 2019, o CBT dá início às atividades do ano também abordando o tema. Em seguida, Jairo apresentou o engenheiro Tarcísio Barreto Celestino, presidente da Associação Internacional de Túneis e do Espaço Subterrâneo (ITA), e passou-lhe a palavra.
Celestino (foto à dir.) falou sobre a importância de procedimentos contratuais específicos para obras subterrâneas. Ele anunciou o lançamento do Livro Esmeralda da Federação Internacional dos Engenheiros Consultores (Fidic), que tem diversas publicações com diretrizes de práticas contratuais para diferentes tipos de obras, adotadas em todo o mundo. O Livro Esmeralda está sendo lançado em parceria com a ITA e vai abordar as práticas contratuais específicas para obras subterrâneas.
Em sua fala, Tarcísio lembrou da tragédia ocorrida recentemente em Brumadinho, Minas Gerais, e da necessidade cada vez maior de colocar em prática a boa engenharia. Em seguida, chamou ao palco seu colega da Universidade da Califórnia, em Berkeley, Randall Essex.
O engenheiro que idealizou o GBR iniciou a explicação de seu método sintetizando: “o papel do GBR é mitigar os riscos do contrato”. Randall Essex (foto à esq.) enfatizou ainda que “é tudo uma questão de pagar o preço justo. Se o contratante quer um túnel que ligue o ponto A ao ponto B, ele deve pagar exatamente por este trecho – e pelos riscos previstos para a construção”.
O Geotechnical Baseline Report é preparado para descrever as condições do maciço e como elas podem interferir na construção, como elas influenciam o projeto, identificar os principais riscos no projeto, definir como esses riscos são compartilhados entre o dono da obra e o executor e definir como as condições não previstas no GBR serão tratadas.
O GBR é, portanto, um documento contratual que contém as condições do solo analisadas antecipadamente que auxilia a administração da cláusula DSC (Differing Site Conditions). Ele serve como guia para a proposta do projeto e auxilia ainda na gestão da construção.
Alguns pontos destacados por Essex foram o compartilhamento dos riscos e também dos objetivos. O engenheiro explicou que é fundamental que as expectativas e também os riscos estejam alinhados. Isto evita disputas e torna a solução dos problemas mais simples.
Ele destacou ainda algumas premissas da construção de túneis
• Contratantes não aceitam o risco, precificam-no.
• É mais barato antecipar os riscos do que ser surpreendido.
• Contratos que antecipam riscos resultam em menos reclamações e menores preços.
Randall Essex encerrou sua apresentação deixando uma sugestão de leitura. O livro Geotechnical Baseline Reports for Construction, de sua autoria, disponível aqui.
Confira a apresentação do engenheiro na íntegra clicando aqui.
Para encerrar o encontro, um debate foi realizado com a presença dos engenheiros Randall Essex, idealizador do GBR, Vitor Aly, secretário municipal de Infraestrutura Urbana e Obras de São Paulo, e Massaru Takeuchi, chefe do Departamento de Projetos Civis do Metrô de São Paulo. Tarcísio Barreto Celestino foi o mediador.
No início do debate, Aly expôs sua preocupação com a qualidade da engenharia brasileira. “Não estamos fazendo engenharia há muito tempo”, afirmou. “O Brasil está assim porque não temos um plano nacional de desenvolvimento. Não há uma constância nos planos de investimento e infraestrutura”.
Massaru Takeuchi lembrou que o Metrô de São Paulo já usou o GBR em algumas obras e ressaltou sua importância na gestão de riscos das obras.
A plateia também participou do debate com suas impressões e algumas perguntas.
Para o secretário municipal de Infraestrutura e Obras de São Paulo, Vitor Aly (foto à dir.), “qualquer movimento que traga ferramentas novas que possibilitem a desjudicialização da engenharia é bem-vindo. Ao trazer um instrumento contratual que possibilita colocar os opostos na mesa para negociar sem que haja necessidade da judicialização, amplia-se muito a possibilidade de viabilizar empreendimentos de grande porte e complexidade. Vejo com muito bons olhos o que foi trazido e discutido pelo CBT aqui hoje”.
“Foi um privilégio ter a presença do Randall Essex falando sobre o GBR”, ressalta Jairo Pascoal Júnior, presidente do CBT. “Para nós, da comunidade técnica, é fundamental conhecer essas ferramentas contratuais para exercer uma engenharia cada vez melhor. E, claro, nada como ouvir sobre o assunto do próprio criador. Foi uma ótima noite de discussões”.
“Para o Instituto de Engenharia, é uma honra ter uma parceria ativa com o CBT”, afirma a vice-presidente do IE, a engenheira Miriana Marques. “As boas técnicas e práticas que o CBT pode nos mostrar para conscientizar a engenharia como um todo são muito importantes. Isso caminha junto com as ideias e a missão do IE, que é mostrar ao mundo que a engenharia tem boas práticas, bons profissionais”.
Para Adriano Saldanha, secretário geral do CBT, “esta parceria com o IE viabiliza mais eventos técnicos num ambiente onde a engenharia brasileira já está reunida. É uma união de forças em prol da qualidade da engenharia”.