Sérgio Fontoura é o segundo entrevistado da série de reportagens “Túneis e Estruturas Subterrâneas – o pensamento e a pesquisa das universidades brasileiras”. Professor associado da PUC-Rio, ex-presidente do CBT (Comitê Brasileiro de Túneis) e do CBMR (Comitê Brasileiro de Mecânica das Rochas) da ABMS, Fontoura dá sua opinião sobre o ensino de engenharia de túneis no Brasil e fala sobre a cultura tuneleira no país, além de comentar algumas inovações envolvendo o espaço subterrâneo. Leia a seguir a íntegra da entrevista, elaborada pela equipe da Strada Comunicação sob orientação da Diretoria do CBT.
Com longa experiência em mecânica das rochas, Sérgio Fontoura trata, na academia, de soluções para problemas de engenharia. Aí se encaixam, entre outras coisas, os túneis e as escavações subterrâneas. Para o professor, o ensino de engenharia de túneis no Brasil é de altíssima qualidade.
Prova disso é que o país já elegeu André Assis e Tarcísio B. Celestino, renomados acadêmicos brasileiros, como presidentes da ITA – International Tunnelling and Underground Space Association. “Se o conhecimento que detemos sobre túneis não fosse reconhecido internacionalmente, o Brasil seria um mero figurante na cena internacional. E o que acontece hoje é que estamos com o papel principal, com Tarcísio na presidência da Associação Internacional”.
“André Assis e Tarcísio Celestino são nomes respeitados no mundo inteiro quando se fala em túneis”, destaca Fontoura. “E eles são professores, orientam teses, participam de discussões. Ou seja, o conhecimento está sendo transferido. O que acontece, no entanto, é que, ao chegar ao mercado, outras forças aparecem”.
“Na década de 1980, e isso antecede até a criação do Comitê Brasileiro de Túneis, a cultura de túneis no Brasil era muito forte. Depois disso, a falta de investimentos em infraestrutura desacelerou esse processo e a grande maioria dos profissionais que trabalhavam com túneis tiveram de seguir para outras áreas”, lembra Sérgio Fontoura.
Hoje, a falta de obras subterrâneas no Brasil está muito relacionada ao poder público, à falta de investimentos e ao quase monopólio de algumas grandes empresas no setor da engenharia civil.
“Essas empresas concentraram todas as grandes obras no país e elas ditaram as regras de sempre trabalhar na superfície”, afirma o professor da PUC-Rio. “Especialmente nos últimos anos, o que se viu é que estávamos – e ainda estamos – num processo absolutamente viciado (e corrupto!) envolvendo as grandes empreiteiras e o poder público”.
“Por conta de tudo isso, o custo de uma obra no Brasil é muito superior ao custo da mesma obra, com a mesma tecnologia, feita no exterior”, destaca. “Isso também acaba desestimulando a cultura de túneis”.
Um dos grandes desafios da indústria tuneleira, atualmente, é na área de escavações subterrâneas profundas, onde há alto risco de rupturas com liberação de energia. E importantes inovações vêm acontecendo.
“Esse tipo de problema exige um desenvolvimento de novos sistemas de estabilização, mais flexíveis para acomodar o movimento das rochas sem permitir o desmoronamento”, explica Fontoura.
“O que existe de bastante inovador nessa área é exatamente o desenvolvimento e o uso desses sistemas flexíveis e o monitoramento das vibrações e da emissão de energia através do monitoramento microssísmico, que são os sinais gerados durante o processo de ruptura das rochas. Desta forma, é possível identificar o nível e a localização da ruptura, evitando acidentes”.
Para Sérgio Fontoura, “o CBT assumiu um papel de destaque no cenário tuneleiro internacional e hoje tem uma posição sólida entre as associações de túneis”. Para ele, o Comitê vem desempenhando um papel importantíssimo ao difundir o conhecimento na área, divulgar os túneis não apenas para a comunidade técnica, mas para a sociedade como um todo.
“O Comitê conta com um grupo de jovens – o CBT Young Members, que está incentivando a garotada, criando cursos, eventos, aumentando a interação com a sociedade. Isso tudo é extremamente importante”.
O ex-presidente do CBT acredita que o próximo e importante passo do Comitê deve estar presente em discussões junto ao poder público no sentido de fortalecer as iniciativas, declarar a capacitação do país na área de túneis. “É preciso trabalhar na formatação de algumas diretrizes, de políticas públicas, se envolver em discussões contratuais”, ressalta Fontoura. “Acredito muito na força do CBT para contribuir nessa discussão e, aos poucos, implantar novamente a cultura dos túneis no Brasil”.